Entrevista a José L. Nueno (“Hipersuper”, Portugal)

A vinda de José Luís Nueno ao Congresso Internacional de Marketing, organizado pela APPM, serviu de pretexto para a entrevista a um dos maiores especialistas em distribuição e retailing”Os consumidores têm estado sobre stress há muitos anos”.

Se na apresentação efectuada no último Forum da APED, realizado em Março de 2007, José Luís Nueno, professor do departmento de marketing do IESE, em Barcelona, e especialista em distribuição e retailing, identificava quatro eixos fundamentais para se chegar ao consumidor, a crise não os alterou, somando-lhe mais dois. Em entrevista ao Jornal Hipersuper, Nueno admite que o preço tornou-se num dos factores mais importantes para o consumidor e, no futuro, nem mesmo a inovação poderá significar a sobrevivência de algumas marcas.

Hipersuper (H): No Forum da APED, realizado em Março de 2007, apresentou quatro eixos que nos trouxe ao actual consumidor: alterações geopolíticas, hegemonia do modelo discount, horizontalidade e o poder do consumidor. Estes eixos ainda se mantêem com a actual crise económico-fianceira e o próprio desenvolvimento do retalho? José Luís Nueno (J.L.N.): Sim, mantêem-se. As tendências do consumidor nunca poderão ser vistas a curto prazo como os marketeers pretendem. No entanto, estes quatro eixos são equilibrados com outros emergentes, tais como anti-consumismo ou expropriação da liberdade de escolha.

H: Também referiu na altura que qualquer modelo de negócio de um retalhista necessita da cumplicidade por parte do consumidor para obter sucesso. Como é isto alcançado?
J.L.N.: Nalguns mercados, os consumidores têm estado sobre stress há muitos anos. Os salários reais aumentaram a inflação laboral. O sistema de saúde reduziu o apoio. Os empregos são mais voláteis. Complicidade significa ganhar a confiança.

H: Esta complicidade é alcançada através de preços baixos?
J.L.N.: O preço tornou-se no elemento mais importante. Nalguns tipos de consumo, tais como bens não discricionários, os preços baixos determinam a possibilidade de consumi-los.

H: O consumidor tem, na realidade, a capacidade e poder para alterar o actual modelo retalhista? Como?
J.L.N.: Os consumidores estão a mudar os modelos de retalho sob várias formas. O consumidor mudou o retalho através do seu comportamento protector. Actualmente, o consumidor está a organizar-se em redes fortes e sociais que, além do comportamento, são responsáveis por opiniões positivas ou negativas.

H: Neste contexto, que importância possuem as marcas próprias da distribuição para atrair a fidelidade e cumplicidade do consumidor?
J.L.N.: As marcas próprias possuem vários degraus de sucesso. Quando a disponibilidade e capacidade de produção de marcas de qualidade (ou falta dela) é baixa, isto determina quotas de mercado reduzidas.

Nalgumas categorias, os consumidores são muito fiéis às marcas de fabricante porque associam-nas com know-how e tecnologia. Noutras – existem alternativas – a baixa fidelidade por parte do consumidor, falta de consistência nos investimentos de branding e liderança de categoria resultam em altas quotas de mercado das marcas próprias.

H: No futuro só as grandes marcas é que manter-se-ão no top of mind do consumidor?
J.L.N.: Em categorias maduras, estabelecidas e massificadas, as marcas top, marcas de grande distribuição nacional e marcas de nicho terão mais possibilidades de sobreviver.

H: A inovação é a resposta que as marcas necessitam para o sucesso?
J.L.N.: Não. Nalgumas categorias, nem mesmo a inovação será o bilhete para o sucesso.

H: No retalho, a segmentação é cada vez maior, trazendo conceitos tais como o gourmet, eco, bio, conveniência, etc.. Será que esta segmentação ganhará a fidelidade e cumplicidade do consumidor?
J.L.N.: Não, ou melhor, nem sempre. Em momentos de dificuldade, tal como o que estamos a viver actualmente, a complexidade e outros custos associados à sobre-segmentação são incomportáveis e inaceitáveis para o consumidor.

H: Qual o formato/conceito com maior potencialidade no futuro: hipers, supers, discount, department stores ou lojas de conveniência?
J.L.N.: Uma loja discount, oferecendo proximidade, preço e simplicidade, bem como um horário alargado, perecíveis e serviços.

H: A Internet e as novas tecnologias estão a modificar a forma como as marcas, retalhista e consumidor comunicam?
J.L.N.: Sim, em muitas categorias. A eficiência na obtenção e organização da informação de mercado e a transparência que traz são um complemento.

H: A actual crise económico–financeira alterou alguma coisa no desenvolvimento do retalho e do próprio consumidor?
J.L.N.: O consumidor há muito que dava sinais de estar sob pressão, saturado, menos inclinado para o consumo, preocupado com o controlo governamental sob a liberdade de decisão, inquieto sobre o poder das grandes companhias e, em geral, mostrava oposição às insinuações e comportamentos contraditórios.

 

Interview with José Luis Nueno, published in Hipersuper, January 15th, 2009

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